Ah, como é bom ser jornalista!
Essa semana vou usar o espaço da minha coluna para falar de algo bem pessoal: o jornalismo na minha vida. “Ah, como é bom ser jornalista.” Ontem me peguei repetindo essa frase durante todo o dia, ao relembrar o que já vivi nessa área da comunicação. Olha, talvez vire um bordão que eu vá usar muito. E pensar que me descobri no jornalismo, cursando Gastronomia, dá para acreditar? Fica comigo até o fim do texto que irei te contar tudo!
Para muitos pode ser somente mais um dia do jornalista. Inclusive alguns colegas meus nem lembravam da data. Mas para mim esse 7 de abril tem um sabor especial e diferente: meu primeiro dia do jornalista exercendo a função e no ano dos 30 anos do curso onde me formei.
“Sinais, fortes sinais.” A frase de (José Maria) Eymael, “o democrata cristão”, lendário político brasileiro combina com aquilo que a vida me deu, e muito, durante alguns anos antes do meu ingresso no jornalismo.
Sinal I
Em 2011, enquanto aluno de Administração, eu precisava fazer um trabalho para a disciplina de língua portuguesa. Pensei: seria legal sair por aí entrevistando pessoas e profissionais da área para levantar os principais erros de português que ocorriam no nosso cotidiano. Falei para meus colegas de grupo: que tal gravarmos um jornal? A resposta foi: você é doido? Como vamos conseguir isso? Falei: deixa para mim.
O espírito de comunicador, que já habitava em mim, me moveu a ir ao Laboratório de Comunicação (LabCom-Uniso) e apresentar a ideia. Recebi a autorização, mas também uma difícil missão: editar todo o material por conta própria. Naquele tempo eu tinha conhecimento zero de edição, mas eu tinha o espírito da comunicação. Lembro-me de usar o Windows Movie Maker para edição e o Power Point para vinhetas e GC. Até que não ficou ruim não viu. E como eu assumi a bronca de dar certo a ideia, fiz um pouco de tudo. Desde roteirista, âncora e cinegrafista, a sonoplastia e efeitos visuais.
Sinal II
Ainda no curso de Administração só que dessa vez em uma disciplina de marketing e no ano de 2014, dei a ideia de gravarmos um programa sobre o comportamento do consumidor. Novamente fiz todas as funções comunicativas. Desta vez fui até o editor “sacana” que ao final colocou os erros de gravações. Deu super certo novamente.
Sinal III
Em 2018, eu cursava Gastronomia. Era muito legal, mas havia aquela sensação de “está faltando algo”. Um dia eu e alguns colegas de classe fomos a uma escola pública fazer uma palestra para o pessoal do ensino fundamental. Foi muito boa a interação. Ao retornar para a faculdade uma professora estava buscando alguém para a gravação de um vídeo propaganda do curso, mas ninguém estava com coragem, a vergonha imperava. Ela falou comigo e pensei: por que não? Bora lá.
O vídeo deu super certo, houve um retorno até que interessante e algumas pessoas me falaram: você leva jeito para a coisa, já pensou em fazer comunicação? Na hora pensei: olha que ideia do povo, nada a ver.
Os dias foram passando e aquilo continuava pairando na minha cabeça. Entrei no site da Uniso, peguei as grades dos três cursos de comunicação – Jornalismo, Publicidade e Relações Públicas – e comecei a comparar e analisar qual se parecia mais comigo. E jornalismo ganhou. Meus gostos pela leitura e escrita e onde se localizavam meus ídolos da TV foram fatores decisivos.
O pensamento em desistir
Pronto, em 2019 lá fui eu para o Jornalismo. Naquele tempo fui muito bem recebido pela coordenadora da época, Andréa Sanhudo Torres. Logo no primeiro semestre já veio o teste. Em uma aula da professora Evenize Batista, vi alguns vídeos sobre “o que não fazer no jornalismo”. Um deles mexeu muito comigo. Era de um repórter enfiando o microfone no rosto de uma mãe que havia acabado de reconhecer o corpo do filho naquele atentado à Escola Estadual Professor Raul Brasil no município de Suzano. Era perceptível o incômodo dela. Por estar ao vivo, ele foi insistindo com ela por diversos metros, mesmo com os protestos dela dizendo “por favor, não quero falar, só quero enterrar meu filho”.
Depois disso eu estava decidido a trancar o curso. Mas Evenize não me deixou. Eu disse a ela: professora, se for preciso fazer isso para ter audiência e sucesso na carreira eu não quero. Ela sentou comigo, conversou bastante, me mostrou os caminhos e me deu um abraço que não esqueço até hoje. E que sorte a minha tê-la escutado.
Primeiros trabalhos
Na sequência, Evenize me apresentou a Agência Focas de Jornalismo, onde publiquei minha primeira matéria da vida (https://focas.uniso.br/index.php/2019/11/06/sorocaba-marca-posicao-no-mapa-da-cerveja-artesanal/). E foi bom não ter desistido. No semestre seguinte consegui emplacar uma matéria de duas páginas cheias na versão impressa do jornal Cruzeiro do Sul (https://www.jornalcruzeiro.com.br/cultura/samba-autoral-resiste-em-sorocaba). Isso me deu grande visibilidade, me rendeu elogios e me confirmou que eu estava no caminho certo.
Um prêmio estadual
Os anos foram passando, veio a pandemia, aulas online e aquela loucura toda que já sabemos. No 5º semestre conheci uma pessoa que mudaria minha vida, a professora Mara Rovida. Lembro-me de, após algumas aulas e um pouco mais de convivência, lhe fazer um pedido: “professora, você poderia tirar a máscara um pouquinho, nunca tive aula com você, gostaria de conhecer o seu rosto”. A resposta veio com um sorriso que jamais irei esquecer. Eu estava desanimado no meio do curso, não escrevendo nada além do que fosse obrigatório.
Mara me veio um dia e disse: tenho um desafio para você, já pensou em escrever matéria para concurso? Quando vi que o tema era agronegócio (algo que eu nunca havia escrito) pensei em dizer não. Mas quem é professora sabe provocar seu aluno. E o resultado veio: fomos selecionados e recebi o prêmio José Hamilton Ribeiro na cidade de Ribeirão Preto/SP, concorrendo com mais de 103 matérias produzidas em grandes universidades do estado de São Paulo. Mara me levantou do limbo onde muitos alunos caem na metade do curso.
TCC, livro reportagem e formatura
O temido para mim, apesar do pouco tempo, foi tranquilo. Mas também porque escolhi um tema que me agradava: Africanidades em Sorocaba. E falando nisso, preciso deixar registrado algo muito importante que o jornalismo me trouxe: a consciência de classe e minha aproximação maior com as questões raciais.
Meu livro reportagem foi outro grande prêmio que o jornalismo me deu. Conhecer a figura do professor negro e fundador do Nucab (Núcleo de Cultura Afro-Brasileira de Sorocaba) Jorge Narciso de Matos foi algo que mudou minha vida e me deu a oportunidade de apresentar meu trabalho em um palco que antes era ocupado por meus ídolos negros sorocabanos.
Mas tudo que é bom um dia acaba. Chegou o fim do curso. Do curso, mas não dos estudos, pois engatei o mestrado em Comunicação e Cultura na sequência. Fui orador da minha turma na colação de grau em Jornalismo. Fiz questão de escrever um discurso contundente. Relembro um trecho que hoje, nesse dia do jornalista, ainda faz todo sentido para mim:
“Fazemos parte de uma classe que vem sendo muito desrespeitada nos últimos anos. Nunca se viu, em tempos de democracia, tantas tentativas de silenciamento. Tivemos jornalistas mulheres desrespeitadas profissionalmente e violentadas moralmente, até por quem governava esse país. Tivemos jornalistas que foram assassinados por trazerem a verdade, denunciando a barbárie. Então, em meu nome e em nome dos meus colegas, eu digo a quem me ouve agora: NINGUÉM IRÁ NOS CALAR!“
2025 chegou chegando
E chegando nos dias atuais, no mês de março assumi a vaga de jornalista na Assessoria de Comunicação da Uniso. E eu não posso fechar esse texto sem citar uma grande emoção vivida no mês que passou.
Na primeira colação de grau no ano em que o curso completa 30 anos, vi uma mulher, aluna da primeira turma de 1995 e atual coordenadora presidindo a mesa, e tendo ao lado outra jornalista de fibra: a professora Mara Rovida. Como dizia minha falecida avó: “isso não tem preço que pague”. Foi um momento histórico. E ambas para colar grau da minha querida amiga Beatriz Jarins.
Vê-la, minha irmã de profissão e da vida, uma mulher preta, prounista, da Silva entrar carregando a bandeira do curso em um ano tão importante é algo que irá reverberar ainda por muito tempo em minha mente. E tudo isso quando? No mês das mulheres, nada simbólico.
Ah, como é bom ser jornalista!
