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Yerma é o grito da mulher entre maternindade e identidade

Apresentada pelos alunos do Conservatório de Tatuí, a peça convida a uma reflexão sobre questões que estão longe de ser passado

Por: Letícia Américo Camargo (Agência Focas – Jornalismo Uniso)

Yerma, durante um de seus devaneios, se imagina com seu filho em seus braços – Foto: Letícia Américo

A turma do terceiro ano de teatro do Conservatório de Tatuí escolheu o pátio da Fábrica São Martinho para uma adaptação intimista e inovadora da peça Yerma, de Federico García Lorca. A apresentação aconteceu na última terça-feira (14), em um ambiente que, por suas características, complementou a atmosfera de confinamento e frustração presentes na trama. Atualmente tombada como patrimônio histórico da cidade, a Fábrica São Martinho foi, por muitos anos, uma das principais indústrias têxteis do país. Suas ruínas complementam a encenação, refletindo o ambiente inóspito e degradado vivido pelas personagens.

Escrita em 1934, em um contexto de intensa repressão social e religiosa na Espanha, a obra de García Lorca coloca em cena as limitações de uma mulher em uma sociedade patriarcal, onde a maternidade é vista como a única forma de realização para as mulheres. A garota, assim como muitas jovens, vive a ilusão de um casamento arranjado e espera uma vida de paz com seu marido, que por sua vez, à rejeita. Ela se mostra uma mulher necessitada, da vida, das dores e da alegria de algo que não pode viver. Sua necessidade da maternidade, é apenas parte de um desejo incessante por uma vida que não pode ter.

Entre tecidos e pedregulhos, os alunos brincam com a linguagem poética e atual para apresentar ao público a vida da personagem que é interpretada por três atrizes, a fim de pontuar a passagem de tempo e mostrar as diferentes nuances à personagem, explorando as transições emocionais e psicológicas ao longo dos anos. A escolha de múltiplas intérpretes não apenas enriquece a representação de Yerma, mas também simboliza as diversas facetas de uma mulher em busca de sua identidade, revelando suas contradições internas e a evolução de seus desejos e frustrações.

A primeira, que interpreta a jovem no início de seu casamento, possui um ar doce e ao mesmo tempo certa de suas opiniões e modo de ver o mundo. A segunda, encantada com seu passado, relembra um antigo amor, que poderia, talvez, preencher e acalentar seu coração. Por fim, após uma década de um casamento frustrado e uma vida miserável, Yerma se torna uma mulher que demonstra suas vontades, suas raízes, que derruba sua máscara e luta por todas as suas versões que vivem dentro de si, gritando para serem libertas.

Durante seus devaneios, personagens secundários – mas de grande importância para seu desenvolvimento – incentivam a busca pelo prazer do corpo, da alma e da existência, e fazem Yerma se libertar das amarras colocadas sobre si ao longo dos anos.

João, o marido de Yerma, é um reflexo da sociedade patriarcal e religiosa que a oprime. Sua atitude rejeitante e cruel em relação à esposa não é apenas um reflexo de seu caráter, mas também das imposições sociais de sua época, que o tornam uma vítima do mesmo sistema que subjuga Yerma. O personagem, também se mostra vítima de um destino cruel e cheio de mentiras, o levando para um caminho sem volta.

No fim, Yerma é uma obra que transcende o tempo, levantando questões profundas sobre a condição feminina, a maternidade e a busca por identidade. Mesmo escrita no século XX, a peça ressoa com temas ainda muito atuais, retratando uma mulher fragilizada pela dor de não poder ser mãe. Embora capaz de encontrar, em momentos, algum consolo na vida, Yerma anseia, acima de tudo, por carregar o fruto de seu ventre nos braços. E, mesmo ciente de sua angústia, a vida não é piedosa com ela.

Próximas apresentações

Os alunos do curso de teatro do Conservatório de Tatuí devem realizar novas apresentações em breve. Para saber mais sobre a agenda cultural e acompanhar as oportunidades de assistir peças, concertos, recitais, entre outras apresentações, basta acessar o site:

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