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Uns dias no Chile

Sempre que eu ouvia falar do nosso vizinho de América Latina, as primeiras coisas que me vinham à cabeça eram: a dupla letal de centroavantes da Copa do Mundo de 1998, Marcelo Salas e Iván Zamorando; o ditador Pinochet e os 33 homens que ficaram presos em uma mina por 70 dias depois de um acidente em 2010. Aproveitando, Os 33 também é o nome de um excelente filme com Rodrigo Santoro e Antonio Bandeiras que conta essa história. Dessa vez eu iria conhecer o país, colocar meus pés em solo internacional pela primeira vez.

Só o voo de ida já daria uma crônica: fui acompanhado por celebridades como Carlinhos Aguiar (das pegadinhas do Silvio Santos); o eterno “Mionzinho” (figurante dos programas do Marcos Mion); o cantor Ovelha com seus característicos cabelos louros; a modelo Gianne Albertoni; a modelo e atriz pornô Vivi Fernandez; e a comediante Cris Paiva. Parece aqueles sonhos malucos que se a gente contar ninguém acredita. Sonhos foi o que menos tive na viagem, pois Carlinhos e Ovelha conversaram e riram a viagem toda, kkkk.

Na ida e na volta não pude deixar de fazer meu exercício rafaeliano de contar quantos pretos e pretas existiam nos lugares. A resposta foi a de sempre: poucos. Mas em uma proporção muito, mas muito menor do que eu imaginava. Geralmente em cargos mais baixos eu sempre encontro um irmão de cor. Mas lá quase não se via negros/negras, seja em qual fosse o escalão hierárquico.

Vi situações tristes, como pessoas balançando canequinhas pedindo umas moedas como doação, crianças limpando vidros dos carros, idosos como flanelinhas e jovens esperando alguma doação de alimentos nas beiras das feiras. Duas coisas também me chamaram atenção, ambas no metrô de Santiago: um deficiente visual com um amplificador pendurado no pescoço, com um microfone na mão e cantando músicas típicas da região; e uma moça de traços orientais vendendo água, com seu filho preso ao corpo através de um sling. Fiquei por vários minutos pensando quais necessidades aquela mãe deve passar nessa empreitada em busca do sustento próprio e de sua criança? Talvez em um país mais desenvolvido ela teria mais condições financeiras?

Como na maioria dos países, as pessoas da capital não tinham muita paciência com um turista brasileiro que sabia falar muito pouco de espanhol. Algo totalmente diferente do público da cidade de Valparaíso, por exemplo. Chegando lá me deparei com uma “feira do rolo” (muito parecida com a nossa feira da barganha de Sorocaba/SP) em uma linha reta quilométrica. Pensei: “é aqui mesmo que quero ficar, encontrei o povão”.

As pessoas dessa região foram muito mais acolhedoras, humildes e pacientes. Me senti na minha quebrada. Mas a sujeira nas ruas e as visíveis necessidades básicas para sobrevivência também foram impactantes.

A proibição do consumo de bebidas alcoólicas nas ruas foi algo estranho para mim, mas esse choque de cultura me fez entender o motivo de muitos estrangeiros ficarem apaixonados (e muitas vezes bêbados) pelas ruas brasileiras. E os vinhos vendidos em “caixinhas de leite”? Sensacional!

O clima ameno e a vista da cidade toda cercada pelas Cordilheiras dos Andes, instigaram eu e minha companheira a não optar pela compra de um chip, o que facilitaria o uso de carros de aplicativos, fazendo a maioria dos trajetos a pé. Teve dia de andarmos 12 km entre as saídas do hotel pela manhã e o retorno por volta das 22:00 ao pôr do sol. Sim, lá anoitece após as nove da noite.

Mas houve momentos de tristeza, dor e embrulhos de estômago: a visita ao Museu da Memória e dos Direitos Humanos. Toda a minha repulsa aos governos militares ditatoriais só aumentou. É de partir o coração o gigante painel com milhares de desparecidos, os relatos de crianças presas e separadas dos pais. Tudo o que vi, só reforçou ainda mais o nojo que sinto tanto das pessoas que participaram do golpe, quanto daquelas que defendem ou pedem a volta dessa terrível barbárie.

Foi uma experiência incrível. Em muitos museus que visitei, estava ocorrendo visitas de escolas de ensino fundamental. Era de emocionar ver o brilho nos olhos das crianças maravilhadas com o que viam. E vendo a pedagogia, na prática, era preciso andar olhando para o chão, para não pisar em nenhuma das crianças que se juntavam em grupos para preencherem as atividades propostas nos seus “roteiros de viagem ao museu”.

E as casas de Pablo Neruda então? Quantas histórias aqueles imóveis não assistiram? Quantas poesias não foram escritas naquela vista do mar de Valparaíso? Simplesmente indescritível.

E para fechar o texto de hoje com risos, nunca mais reclamo das praias brasileiras! A deles é só para sentar, conversar e nada mais. Arrisquei, até coloquei os pés no Pacífico em Viña del Mar, mas depois precisei de uns 10 minutos para eles descongelarem, kkkkk.

Chi, chi, chi…lê, lê, lê, Viva Chile!

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