Quatro décadas entre estantes de livros, sistemas, reformas e gerações de alunos
Por Giovana Lima (Agência Focas- Jornalismo Uniso)
Por 40 anos, a bibliotecária Regina Célia Ferreira Boaventura tem sido testemunha e protagonista das transformações vividas por uma das instituições mais importantes de uma universidade: a biblioteca. Desde 1985, quando ainda era a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, Regina trilhou um caminho que começou com o estágio, passou pelo cargo de funcionária administrativa, até chegar à função que exerce há 27 anos com dedicação e entusiasmo: a de bibliotecária.
Hoje, ela é responsável por tarefas que vão muito além de guardar livros. Gerencia o software Pergamum, sistema que organiza todo o acervo e os serviços da biblioteca desde 1998. Também atua nas áreas de referência, com atendimento personalizado aos alunos, e no processamento técnico, que cuida da organização e disponibilização dos materiais físicos e digitais. Ao lado da colega Maria Carla, ela forma uma dupla que atende às múltiplas demandas de uma biblioteca universitária moderna.
“Eu sempre falo que a biblioteca tem começo, meio e fim. O começo é a seleção do acervo. O meio é todo o trabalho técnico de preparo. E o fim é o serviço que o usuário vê: as estantes organizadas, o sistema funcionando, a informação acessível”, explica Regina.
Para Regina, a biblioteca ainda é essencial no mundo contemporâneo. “O Google é a maior biblioteca do mundo, mas é uma biblioteca sem filtro. A gente está aqui para oferecer informação confiável, com base científica, validada por especialistas”, afirma. Ela destaca o papel da biblioteca universitária como orientadora na formação acadêmica, principalmente por meio dos acervos físicos e das plataformas digitais, como o Portal de Periódicos da Capes e as bibliotecas virtuais da Pearson e da plataforma A, que garantem acesso a conteúdos especializados.
“O nosso papel é mostrar ao aluno os caminhos mais seguros para a recuperação da informação. Muitos precisam de ajuda para navegar por esses sistemas, e é por isso que oferecemos treinamentos e suporte.”
Apesar das inovações, Regina reconhece os desafios enfrentados pelas bibliotecas na era digital. A mudança nos hábitos de leitura, marcada pela busca por conteúdos rápidos e curtos, tem afastado muitos estudantes da leitura profunda e reflexiva. “O aluno não quer mais ler. Ele quer um resumo, algo imediato. Isso compromete a absorção real do conhecimento”, lamenta.
Mesmo assim, ela acredita que as bibliotecas físicas ainda têm um papel relevante, especialmente por conterem documentos e obras que não estão disponíveis online. “Tem muita coisa que só está no papel. Quando se quer recuperar uma informação histórica, uma obra rara, é no físico que se encontra. Por isso, acredito que esses dois formatos ainda vão caminhar juntos por muito tempo.”
A biblioteca, como Regina costuma dizer, é um “organismo vivo”. Está em constante transformação: mudam-se os acervos, os espaços, as tecnologias. E, com isso, mudam-se também as histórias. Uma das mais marcantes aconteceu no antigo campus do Trujillo, quando o trem que passava próximo ao prédio causou um tremor tão forte que derrubou todas as estantes da biblioteca subterrânea. “Foi um efeito dominó. Misturou todo o acervo e levou muito tempo para reorganizar tudo. Tivemos que prender as estantes na parede depois daquilo”, lembra rindo.
Outro marco foi a construção do atual prédio da biblioteca, inaugurado em 2004. “Foi a primeira vez que tivemos um espaço feito especialmente para isso. Temos orgulho de mostrar a biblioteca hoje. A achamos linda.”
O espaço também é aberto à comunidade externa, embora o hábito de frequentar bibliotecas ainda não seja comum fora do ambiente acadêmico. Regina cita o exemplo de Ricardo, um usuário assíduo que frequenta o local mesmo sem formação universitária. “Ele retira livros com uma frequência incrível. É um caso que nos mostra como a biblioteca pode acolher e transformar, independentemente da formação.”
Com a experiência de quem passou quatro décadas entre estantes, sistemas, reformas e gerações de alunos, Regina deixa um recado: “O conhecimento precisa ter origem em fontes confiáveis. Procurem essas fontes. Equilibrem o uso dos formatos físico e digital. A riqueza do saber está em todos eles.”



