Nanopartículas, a ‘’macrorrevolução’’: como a nanotecnologia pode ajudar empresas do setor agrícola
Startup criada dentro de universidade comunitária em Sorocaba/SP oferece recursos de pesticidas mais sustentáveis, utilizados para commodities e agricultura familiar
Por Beatriz Jarins e Rafael Filho (Agência Focs – Jornalismo Uniso)
Segundo o INPI (Instituto Nacional da Propriedade Industrial) – por meio do documento Radar Tecnológico, publicado pelo órgão em 2023 – de 2000 a 2020, houve um aumento de mais de 325% no número de pedidos de patentes relacionados à nanotecnologia, somado os pedidos de residentes e não-residentes. A pesquisa identificou 14 startups entre os depositantes, sendo cerca de 44% dos pedidos relacionados ao setor de “biotecnologia”. O diagnóstico de gênero mostrou que 45% dos inventores na área de nanotecnologia são mulheres.
Sediada na Universidade de Sorocaba (Uniso), a Priobio, startup de nanopartículas, foi fundada no final de 2022, mas começou a atuar em julho deste ano. A empresa é liderada pela professora doutora em Ciências Médicas, Renata Lima, que vê a nanotecnologia como um caminho proveitoso para a agricultura, trazendo ainda mais benefícios às plantações.
Assim como outras tecnologias utilizadas para atender a demanda do produtor a fim de produzir mais, em menos tempo e mantendo a qualidade, a nanotecnologia pode ter bastante utilização com intuito de matar patógenos e reduzir o uso de defensivos agrícolas nocivos à saúde, caminhando em parceria com grandes empresas líderes do mercado, com o mesmo foco: oferecer alimentos ricos em nutrientes e em grandes quantidades.
Renata Lima, que é professora-pesquisadora de pós-graduação com ênfase em Biologia Molecular, comenta que a ideia do uso da nanotecnologia é substituir ao máximo o que é tóxico para o meio ambiente. “Não tem como zerar, pois o Brasil depende de defensivos agrícolas e fertilizantes, mas a nanotecnologia está aí para ajudar na redução dos impactos”, aponta.
A nanotecnologia pode ajudar na fertilização, como herbicida para matar ervas daninhas, tratar o solo a partir dos microorganismos e proteger as sementes, já que os fungicidas podem danificá-las. “A gente sempre trabalha em prol do controle biológico”, reforça a pesquisadora.
Patrícia Renci, professora e coordenadora do curso de Agronomia na Uniso, ressalta a importância do uso de nanopartículas para o agro. Segundo ela, essas tecnologias contribuem para novas estratégias de manejo fitossanitário, otimizando a proteção das culturas.
“As nanotecnologias podem colaborar de forma positiva proporcionando incrementos na produtividade e na qualidade de diversas culturas. Além disso, estes produtos não causam impactos ao meio ambiente, atendem os princípios de sustentabilidade e segurança alimentar”, salienta a coordenadora.
Relação da startup com as empresas do agronegócio
Atualmente, a Priobio, startup que traz a referência de “priorizar a vida” em seu nome, conta com três empresas do ramo agrícola como clientes, sendo que cada uma delas é atendida em mais de um projeto, simultaneamente. Uma empresa, em específico, fica na região de Campinas/SP, a quase 100km de distância de Sorocaba/SP, e a outra está localizada na Colômbia. No caso da última, a startup faz a análise de material da empresa, enviada por transportadora, para que a equipe possa fazer um estudo indicando os melhores métodos a serem adotados. Entretanto, as informações sobre a produção destinada às empresas não foram divulgadas por questões de contrato confidencial.
“Como trabalhamos com organismos, às vezes a gente já utiliza o que temos ou o que a empresa oferece. Nós fazemos as nanopartículas dependendo de cada situação. Geralmente são produtos que eles têm e querem melhorar, ou quando há um organismo novo para ser estudado”, explica a professora.
As empresas acabam entrando em contato com a equipe a partir de uma palestra ou da divulgação de alguma pesquisa realizada. “Eles encontram uma pesquisa realizada por nós. A partir disso, começamos a conversar, sendo feito um acordo de confiabilidade e, então, nós produzimos um projeto, para ver se satisfaz o que eles precisam. Só depois que é feita a parceria da startup com a empresa”, conta Renata, sobre como funciona a relação B2B, modelo de negócio adotado na Priobio.
Renata Lima explica que o motivo para as empresas investirem na startup é por perceberem que o gasto não será tão alto comparado com o lucro que terão. “Se você tem um problema grande na produção e a nossa pesquisa vai resolver e eliminar o problema, valerá a pena, por mais que, em determinados casos, seja caro”, conta.
Nanopartículas ajudam a eliminar o mofo branco
Utilizando a Trichoderma harzianum como principal agente defensivo, em conjunto com as nanopartículas, uma pesquisa recente feita por Renata demonstra resultados positivos para a plantação, por ser uma substância já conhecida pelos agricultores, ao aumentar a produtividade do solo. “A gente tem uma coleção de patógenos, pensando em diferentes pesquisas para serem estudadas a longo prazo. A nanopartícula é boa para ser trabalhada porque é muito pequena, não alterando, de forma negativa, a região onde ela foi colocada”, reforça.
“Testamos a Trichoderma com o mofo branco porque é um dos maiores problemas encontrados na agricultura. Então, ao ter este patógeno presente, o que for plantado ali, pode acabar sendo contaminado”, explica Renata.
Patrícia Renci reforça os cuidados na lavoura quando há existência desta doença altamente destrutiva causada pelo fungo Sclerotinia sclerotiorum, que ataca espécies como o feijão, a soja, o algodão, o girassol, entre outras.
“Pode causar reduções médias de 21% na produtividade da soja, podendo chegar até a 70% em algumas lavouras isoladas. No Brasil, o mofo branco ocorre principalmente nos estados de São Paulo e Minas Gerais. Em Goiás já foram observadas perdas de até 50% no rendimento de várias culturas, além disso, deve ser considerada a provável diminuição da qualidade do produto colhido”, alerta Patrícia que é especialista em Produção Vegetal.
Para Renata, o estudo de nanopartículas utilizando ferromagnético a favor da Trichoderma foi interessante, do ponto de vista científico, por ser um mineral de fácil retirada do solo, posteriormente. Já a nanopartícula de prata foi mais assertiva em eliminar o patógeno sem matar o agente. “Quando começamos a trabalhar com a Trichoderma, em conjunto com as nanopartículas de ferro e prata, percebemos que elas trazem resultados diferentes”, comenta a professora.
Benefícios dos estudos científicos para diferentes tipos de plantações
A pesquisadora reforça que a nanopartícula pode ser utilizada em diferentes plantações, como milho, soja, folhas, entre outros. “Isso é bem interessante, porque tem estudos que a gente mira para commodities, por ser grandes plantações, e outros que a gente pensa na agricultura familiar”, enfatiza.
A preocupação sobre os malefícios que a nanopartícula pode trazer também faz parte da rotina da pesquisa. “A longo prazo, nós fazemos uma previsão do que pode se expressar. A nossa maior preocupação é com o solo e a água. Se chover, a substância ficará na planta ou escorrerá para o solo? Isso é uma preocupação nossa. Então, fazemos acompanhamento para se ter uma ideia”, comenta a professora.
“A nanopartícula sempre existiu, porque o próprio ambiente está fazendo e desfazendo nano o tempo inteiro e você só consegue identificar a nanopartícula quando está trabalhando, mas pegando direto do solo, é quase impossível detectar, por isso que é preciso estudar bastante, para ter a garantia de que deu certo”, conta Renata, afirmando que o estudo praticamente não traz nenhum malefício à natureza.
Impactos que a startup traz para a sociedade
Além de ajudar na área científica e acadêmica, com oportunidades de estágio e pesquisa dentro da Universidade, já que a Priobio conta, atualmente, com duas estagiárias da graduação, duas de mestrado e uma de pós-doutorado, Renata reforça que o principal foco da startup é a sustentabilidade. “Como a gente trabalha com organismos, quando percebemos que a pesquisa pode se tornar um malefício, nós procuramos outras maneiras de fazer”, comenta.
Em defesa da nanopartícula, a professora reforça sobre a importância da sociedade dar uma chance para a pesquisa. “Eu acho que, na verdade, a gente não pode julgar aquilo que a gente ainda não sabe. A preocupação com o ambiente e com as pessoas é muito maior. Então, é importante dar uma chance. Os estudos com nanopartículas estão se aprimorando, as pesquisas estão sendo rigorosas. É preciso confiar. Ciência não é achismo, é fato”, finaliza a professora doutora Renata Lima.