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Entre aplausos e resistência, o teatro pede para ser visto

No Dia do Artista de Teatro, professora e alunos compartilham suas histórias e revelam a paixão por uma arte que transforma vidas, mas que ainda busca espaço e valorização na sociedade

Por: Letícia Américo e Yasmin Machado (Agência Focas – Jornalismo Uniso)

Cenário da peça “Show Opinião” – Foto: Ian Kovalski

O decreto para a criação do Dia do Artista de Teatro no Brasil data de 24 de maio de 1978 e foi celebrado pela primeira vez em 19 de agosto do mesmo ano. A data homenageia artistas que atuam em performances teatrais, atores, diretores, figurinistas e responsáveis pela construção do espetáculo teatral.

Na história nacional, o teatro chegou no século XVI, com encenações religiosas escritas por padres Jesuítas, cujo objetivo era catequizar os povos nativos. Ao chegar ao Brasil, a corte portuguesa autorizou a criação de teatros para atender à demanda da nova aristocracia, impulsionando e moldando a arte cênica brasileira até o formato que conhecemos hoje.

Mais do que uma data comemorativa, o dia é também um lembrete da importância da arte e de quem a mantém viva. Para além da história, estão as vozes de quem respira o palco diariamente — jovens e professores que, entre sonhos e dificuldades, insistem em fazer do teatro uma profissão e um ato de transformação social.

Na infância, Luísa Leite, de 18 anos, já demonstrava interesse pelas artes cênicas ao imaginar-se como atriz das novelas infantojuvenis da época. Aos quinze, após participar de uma peça de teatro da escola, a atriz decidiu correr atrás de seus sonhos.

Sua jornada começou no Sesi de Itapetininga e, atualmente, a jovem atua na Casa Kennedy, também na cidade, onde ambos os espaços oferecem aulas gratuitas de teatro.

A atriz concilia o trabalho, estudos e apresentações. Sua cidade não oferece oportunidades de trabalho no ramo e incentivo a peças, causando a descontinuação de projetos, que segundo ela afetam os atores envolvidos. Mas o amor pelo teatro e o público a fazem continuar.

O projeto “Teatro Literário” é motivo de orgulho para a atriz. A montagem, que passou por problemas financeiros anteriormente, tem objetivo de levar a arte cênica para crianças de escolas públicas e instituições como CAPS. A artista também integra a montagem “Romero e Juliana”, releitura caipira da obra de Shakespeare, dirigida por Fabio Jurera, que recentemente participou da 3ª Mostra de Teatro de Cesário Lange no dia 9 de agosto.

Luísa Leite em apresentação de “O Soldadinho de Chumbo” em projeto Teatro Literário. Reprodução/Instagram

Assim como Luísa, Adriana Afonso, carinhosamente conhecida como Drica, também se deixou encantar pelo teatro ainda na infância. Aos sete anos, descobriu no palco sua paixão e, desde então, luta para se manter como artista na sociedade, enfrentando preconceitos e desvalorização.

Aos 50 anos, Drica é formada em Pedagogia e Gestão Pública. Atualmente, é professora de Artes Cênicas no Conservatório de Tatuí e educadora social no Centro de Orientação e Serviços à Comunidade (COSC), além de atuar como professora de Culturas Populares dentro da Associação das Pessoas com Deficiência (Apodete).

“Quando eu falo que sou professora, todo mundo apoia. Mas, quando digo que é de teatro, que sou atriz, gera uma reação estranha. Meu maior desafio é esse, fazer as pessoas acreditarem na arte como profissão”, comenta.

Mesmo diante das dificuldades, a professora aponta que o teatro contribui para um olhar mais carinhoso sobre a vida e reforça que a arte não é apenas entretenimento, mas também ensino e transformação social.

“O meu desejo para quem quer trilhar o caminho da arte é: não desista. Em tudo vai haver empecilhos, tudo vai ser difícil. Fernanda Montenegro diria ‘não faça’. Eu digo o contrário”, afirma.

Adriana Afonso, professora de artes cênicas e culturas populares – Foto: Arquivo Pessoal

A falta de recursos para a vertente artística é o principal fator desestimulante para os artistas, como a instabilidade financeira, que gera insegurança e revolta. Essa realidade também é sentida por Leonardo Liniker, de 25 anos, que atua como fiscal tributário e é aluno do Conservatório de Tatuí há três anos. O jovem sonha em seguir com a carreira, mas desabafa sobre as dificuldades enfrentadas.

“É uma sobrevivência tão desgastante para o começo de carreira que muita gente desiste logo no início. O que é uma pena porque não há estímulo e isso é muito triste. Você vê colegas que começaram com você parando e pensa que o seu destino também é esse. E essa insegurança que é financeira passa a ser emocional. Será que eu sou um bom artista? Será que eu consigo fazer algo que vai ser notado futuramente?”, relata Leonardo.

Apesar do medo, o aluno diz que as aulas mudaram sua vida e que não desiste porque o amor vai além das barreiras impostas pela vida. “O teatro me ajudou a crescer muito como pessoa, se eu abandonar tudo isso, simplesmente porque parece difícil, eu deixo de ser eu. Agora isso faz parte de mim e não tem como voltar atrás. Ele foi um instrumento de mudança, capacitação, criação e empoderamento da minha personalidade. É aquilo que coube em mim, e eu não tive que caber no teatro, mas ele coube em mim”, finaliza.

Leonardo Liniker, como personagem na peça ‘Show Opinião’, em 2024 – Foto: Ian Kovalski

Mesmo com a falta de incentivo e estereótipos voltados para os atores, o Dia do Artista de Teatro, para Luísa, Adriana e Leonardo, mostra que a homenagem é um reconhecimento que normalmente não lhes é concedido. A data também funciona como um lembrete da importância da arte e de seu impacto na sociedade brasileira.

Entre aplausos e resistência, esses artistas insistem em ocupar o palco, mostrando que o teatro pede, e merece, ser visto.

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