Depressão Pós- Parto: Quando a alegria vira culpa
Transtorno ainda cercado por tabus atinge milhares de mulheres no Brasil; especialista explica sintomas, causas e a importância da rede de apoio no acolhimento materno
Por Maria Clara Russini (Agência Focas – Jornalismo Uniso)
A chegada de um bebê costuma ser retratada como um dos momentos mais felizes da vida de uma mulher. No entanto, para muitas mães, esse período pode vir acompanhado de sentimentos de tristeza, angústia e incapacidade. A depressão pós-parto é um transtorno de humor que afeta milhares de mulheres e, apesar de ser comum, ainda é cercada de tabus e incompreensões.
De acordo com a psicóloga Juliana Piccini, formada pela Universidade Paulista e especialista em Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) pela PUC-RS, a depressão pós-parto pode se manifestar logo nas primeiras semanas após o nascimento do bebê, mas também surgir meses depois. “A mulher tem o filho e, assim, pode demorar um pouco pra surgir, entre uma ou duas semanas, mas também pode ser que apareça depois de alguns meses”, explica.
O transtorno, segundo Juliana, é resultado de uma combinação entre fatores fisiológicos, emocionais e sociais. O desequilíbrio hormonal após o parto é intenso, os níveis de progesterona e estrogênio despencam, alterando neurotransmissores ligados ao bem-estar, como serotonina e dopamina. Mas o problema vai além da biologia. A falta de uma rede de apoio sólida, a privação de sono, o cansaço extremo e a cobrança social pela “maternidade perfeita” tornam o cenário ainda mais desafiador.
“Quando a mulher não tem uma rede de proteção boa, ela vai sofrer muito por conta da privação de sono e fadiga. Isso vai acabar gerando ainda mais pensamentos de que ela não é uma mãe suficientemente boa, que fracassou, que não sabe cuidar do filho”, relata a psicóloga.
Os sintomas da depressão pós-parto se distinguem do chamado “baby blues”, uma tristeza transitória que costuma durar até três semanas após o parto. No caso do transtorno, a tristeza é mais profunda e persistente. A mulher pode evitar o contato com o bebê por medo de machucá-lo, ou ao contrário, se prender excessivamente à criança, tomada por culpa e medo. Em alguns casos, pensamentos autodepreciativos e crises de ansiedade tornam-se constantes.
O tratamento, afirma Juliana, deve ser conduzido com sensibilidade e acolhimento. A terapia cognitivo-comportamental é uma das abordagens mais eficazes. Ela busca ajudar a mulher a transformar pensamentos autocríticos em percepções mais realistas, promovendo autocompaixão e aceitação. “A gente trabalha pra que esses pensamentos se tornem mais realistas, mostrando que é um momento novo, que erros vão acontecer, mas que isso não define o valor dessa mãe”.
O papel dos familiares e parceiros é fundamental nesse processo. Pequenos gestos de apoio, oferecer um tempo para que a mãe possa descansar, tomar banho ou cuidar de si, fazem diferença. A importância da rede de apoio nesses casos, acaba se tornando essencial para mostrar para a vítima que aquele momento é natural, trazendo sensibilidade e não julgamento.
A psicóloga reforça que a depressão pós-parto não é sinal de fraqueza, e sim uma condição que exige compreensão e tratamento. Ela destaca ainda a importância de políticas públicas que garantam atendimento psicológico gratuito e acessível, especialmente para mães em situação de vulnerabilidade.
“É natural às vezes desenvolver depressão pós-parto, mas não é uma regra. E mesmo que isso aconteça, é completamente normal, porque estamos falando de mudanças fisiológicas, hormonais e emocionais intensas.”
Falar sobre o tema é essencial para quebrar o silêncio que ainda envolve a saúde mental materna. A maternidade é feita de amor, mas também de medo, dúvida e recomeço, e reconhecer isso é o primeiro passo para cuidar verdadeiramente das mães.

