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Sorocabanos desconsideram patrimônio cultural

Em cenário marcado por abandono cultural baseado em interesses monetários, prédios históricos abandonados refletem a desvalorização de suas origens

Por Paola Ferreira e Sabrina Alves (Agência Focas – Jornalismo Uniso)

Edifício malcuidado na Rua da Penha, Centro de Sorocaba | Foto: Paola Ferreira

O descaso no âmbito cultural se mostra abrangente conforme a valorização da cultura de uma cidade ou povo. Na cidade de Sorocaba, moradores expõem críticas ao desprezo público e governamental em relação aos prédios históricos. Rodrigo Barchi, 48 anos, professor do Programa de Pós-graduação em Educação (PPGE) e do curso de Filosofia da Universidade de Sorocaba (Uniso) afirma que essa indiferença cultural acontece devido à má construção da educação, que não pontua a importância desses patrimônios históricos. “As escolas estão cada vez mais preocupadas em ‘formar’ pessoas capacitadas para as finanças e para o trabalho, não trazendo a elas a importância da história coletiva.”

Essa invalidação não se resume apenas aos prédios, mas também aos pontos históricos que contribuíram com o desenvolvimento da cidade e hoje permanecem sem a devida preservação, fazendo desses patrimônios algo menosprezado, como dito pelo psicólogo clínico e professor de Debates Sociólogos da Uniso, Daniel Hidalgo, 35 anos. “Temos uma tendência a desvalorizar nossa origem e devo dizer que não é só o sorocabano, é o brasileiro […], nossa cultura acaba não sendo abordada pelo tempo e o número de vezes que deveria.” Hidalgo cita, como exemplo, a Estação Ferroviária Sorocabana, que possuiu não apenas um impacto regional como nacional, sendo responsável pela economia do país no período: “faz parte da história […], por que não é preservado? Isso faz parte da história […]. O sorocabano tem uma identidade muito fraca.”

A forma como, muitas vezes, vestígios históricos acabam sendo apagados por conta de valores ou interesses atuais é de extrema preocupação. Muitos edifícios e monumentos de grande importância são derrubados sem nem uma consideração por sua herança ou memória, reforçando ainda mais a ignorância de um povo que não se interessa em conhecer a própria história. José Augusto Ginjo, comerciante, 47 anos, indigna-se com a situação e defende: “somos um país com mais de 500 anos, temos nossa própria história e cultura, infelizmente isso é falta de zelo pela pátria”. Outro ponto de vista abordado pelo comerciante relaciona-se com como o brasileiro, de forma geral, prefere a cultura estrangeira: “admiramos e gostamos da cultura e história dos outros em vez da nossa própria.”

Hidalgo aborda que tal desvalorização se encontra, de forma indireta, na cultura do nosso país, de acordo com sua história de lutas e pobreza, assim a sobrevivência sendo principal pensamento do brasileiro, em agir conforme sua urgência. O docente afirma que “sobreviver é sempre mais urgente, mas isso não quer dizer que não devemos investir na cultura, porque ao investir na cultura e na educação, quando há projetos que funcionam, consegue-se um povo melhor educado e mais culto. As pessoas tomam melhores decisões e cuidam-se mais, então se gasta menos com saúde, por exemplo, e menos com segurança, porque a criminalidade diminui. Esse investimento não é perdido em relação a essas questões básicas, esse dinheiro é realmente investido e não um gasto.”

Edifício malcuidado em frente à Praça do Canhão, Centro de Sorocaba | Foto: Paola Ferreira

As pessoas acabam esquecendo que prédios e edifícios abandonados contém repertório, que foram importantes ao desenvolvimento. “Se estão tombados é porque contribuíram à cidade que vivemos hoje”, afirma a estudante universitária Camila Fernandes Vicente, 18 anos.

  Além do descuido, a falta da consciência do valor cultural desses patrimônios acaba induzindo a reformas, sendo elas baseadas em interesses de retorno monetário, assim como defendido por Barchi, “faz com que as pessoas nem percebam a sua importância,  se é prédio velho, derruba […], Sorocaba é selvagem no que diz respeito a essa transformação de espaço em dinheiro”, afirma o professor, que encerra: “Sorocaba tem pouco prédio histórico, a ideia é fazer esse massacre constante de transformação das suas estruturas de algo que seja ‘vendável’. […] As pessoas estão vivendo na lógica capitalista, daquilo que lhes traz benefícios, não há mais esse coletivo como antes.”

Entrada do shopping pelo Terminal Santo Antônio | Foto: Paola Ferreira
Pátio Cianê, parte da Nossa Senhora da Ponte | Foto: Sabrina Alves

Pátio Cianê: de fábrica têxtil a shopping center e terminal

Construída em 1881, a Fábrica de Tecidos Nossa Senhora da Ponte, diferente das outras do Estado de São Paulo que se preocupavam com o acumulo de café, tivera sua origem na acumulação do capital comercial oriundo do algodão. A indústria foi um marco na economia de Sorocaba, tendo em mente que a cidade tinha como comércio a feira de muares e o tropeirismo, sendo um grande avanço para a cidade. Foi ampliada em 1913 com a construção da Fábrica de Santo Antônio.

 As atividades da fábrica foram encerradas em 1991. No mesmo ano, parte da unidade Nossa Senhora da Ponte foi demolida, restando alguns galpões da unidade Santo Antônio.

Em 13 de novembro de 2013, foi inaugurado o Pátio Cianê, um shopping feito em meio à arquitetura antiga. Os complexos não foram demolidos por terem sido tombados pelo Conselho do Patrimônio Histórico de Sorocaba e, parte dele, pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico (Condephaat). O shopping é uma mescla do moderno e antigo, isso porque a fachada da Fábrica da Nossa Senhora da Ponte foi preservada, em uma das entradas há um arco de tijolos e a antiga chaminé chama a atenção. Há um fechamento de vidro que expõe os antigos tijolos da fábrica.

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