Reflexões Fotográficas
Esses dias algo me fez refletir sobre qual a importância de uma foto.
Eu estava procurando fotos do recém falecido professor Ademir Barros para uma memória póstuma. Descobri que não tinha nenhuma ao seu lado, somente de sua figura de maneira individual ou junto com outras pessoas. Fiquei pensando, como assim não tenho nenhuma foto com ele? Acabei descobrindo que ele não era o único.
Demorou para cair a ficha, mas depois me lembrei que na maioria de nossos encontros – por conta da lógica de trabalho multitarefa, cada vez mais o jornalista exerce não apenas uma função, mas várias – eu estava atuando como fotógrafo do evento/reunião, e fotógrafo não sai nas fotos.
Será uma solidão fotográfica perpétua?
Não sair nas fotos gera uma sensação de não estar?
Como fica o acervo do fotógrafo? Somente em sua memória?
Em uma viagem mental voltei a 2019 quando entrei no curso de Jornalismo, minhas fotos eram péssimas. A porcentagem de perda era de 70%, ou seja, a cada 10 fotos só três se salvavam. Lembro-me do meu professor José Neto não me deixar desistir quando eu ficava desanimado. Quando acertava, eu dizia “professor, fiz uma foto na cagada” e ele respondia “não existe foto na cagada, sua mente já visualizou aquela cena antes de você dar o click com o dedo”. E para me incentivar ele dizia que “o mais difícil você já tem, que é a percepção. Agora só lhe falta a técnica”.
Devagarzinho as coisas foram melhorando, a margem caiu para 50%, 30% e hoje em dia creio está em 20%.
Ainda na minha viagem fui vasculhar minhas galerias e fiz uma descoberta, tenho muito mais fotos de outras pessoas/ambientes do que de mim mesmo. Será que a posição de fotógrafo me moldou a ser uma pessoa despreocupada com selfies, ao contrário da maioria das pessoas? E olha que sou leonino e filho de Oxóssi.
Na busca achei uma foto minha, 3×4, para utilizar em um documento. Foi uma sensação muito diferente parar para me olhar. Aí te faço uma pergunta: quando foi a última vez que você parou para se olhar em uma foto? O exercício vale a pena.
Talvez pela proximidade ao rosto que este tipo de foto requer, meu olhar estava bem visível nela. Fiquei tempos “me olhando”. Foi uma conversa profunda comigo mesmo, parecia que eu estava olhando para minha alma. Me fiz perguntas, “você viu o quanto você mudou? O quanto evolui nessa vida? Está feliz consigo mesmo?”
Foi muito bom! (olhar fotos é muito bom, talvez estejamos esquecendo disso).
Dizem que fotografar é congelar o tempo e – relembrando o slogan do Repórter Esso – que o fotógrafo é uma testemunha ocular da história.
Quero continuar assim.
Lembrando que foto não é apenas para fazemos vários cliques porque o “biquinho” não ficou tão instagramável.
Demorei um pouco para compreender e por mais que muitas vezes seja estranho ou bata uma dorzinha de arrependimento, não estar em todas as fotos não é nenhuma falta de cuidado consigo mesmo. Não se culpe. Na verdade, você não está na foto pois estava fazendo algo muito mais importante do que imagina, o registro do momento coletivo.
Foto é registro; memória; carinho; prazer; retratar o Outro (sim, com letra maiúscula assim como ensina Sodré); produção de algo que será para uso coletivo; documento histórico e jornalístico, mesmo que você não esteja nela, lembre-se disso.
