Jornalismojornalismo onlineSorocabaUniso

Dia nacional das Baianas de Acarajé: mais que um ofício, uma raiz africana

A data homenageia a profissão que é símbolo de sabor, cultura, fé e resistência no Brasil

Por Rafaela Ferreira Monteiro (Agência Focas – Jornalismo Uniso)

O Dia Nacional da Baiana de Acarajé é comemorado em 25 de novembro. A profissão, regulamentada pelo decreto municipal de Salvador 12.175/1998, é reconhecida por seu valor histórico, gastronômico, cultural e religioso.

O nome do “Acarajé” é oriundo da língua africana Iorubá, sendo a união de “akará” (bola de fogo) e “jé” (comer). O bolinho, típico da culinária afro-brasileira, consiste em uma massa feita de feijão-fradinho, cebola e sal, e frita em azeite de dendê. É classicamente servido com camarão, vatapá, caruru e salada de tomate verde. Foi por meio da venda desse alimento que muitas mulheres, desde o período da escravidão no Brasil, conseguiram recursos para bancar a própria liberdade e o bem-estar de suas famílias. A figura típica da Baiana de Acarajé se tornou símbolo de herança cultural por meio do sabor e da fé.

O acarajé é originalmente um alimento votivo no contexto das religiões afro-brasileiras, ou seja, é preparado para ser consumido como preceito religioso, oferecido às divindades e também às pessoas. Reconhecido como parte do Axé do Orixá (força vital), ele é indispensável para a conservação da vida e para renovar e estabelecer o axé no Candomblé. O bolinho é mais notavelmente vinculado ao culto da orixá Iansã, a orixá do fogo, trovoadas e tempestades, mas também é oferecido a outras divindades como Xangô, Ogum, Oxumaré, Obá e Ibeji. Além disso, a venda do acarajé pelas “filhas de santo” era uma estratégia de manutenção dos terreiros, usada para custear suas obrigações religiosas.

Embora a origem do ofício seja de “filhas de santo”, atualmente, o termo “baiana de acarajé” engloba uma categoria profissional e cultural mais ampla.

Luzia Jesus Cruz é uma baiana de acarajé natural de Jequié, Bahia. Ela conta que sua avó, Balbina, era neta de escravizada, e foi quem a ensinou a fazer acarajé aos 10 anos de idade. “Eu tomei gosto pelo ofício, e hoje estou prestes a fazer 45 anos e faço acarajé aqui em Sorocaba há 9 anos.”

Luzia trabalha com seu marido José Wilson, que cuida da logística por trás das vendas. Juntos, eles compram os insumos para a produção artesanal do acarajé e organizam seus pontos de venda em feiras e eventos.

Raimunda Santos de Jesus é natural de Salvador, Bahia, e também trabalha como baiana de acarajé em Sorocaba. O alimento sempre fez parte da história de sua vida. “Eu começo a fazer acarajé com idade de 10 anos, aprendi observando. Minha tia era umbandista e fazia, mas não queria me ensinar. Eu perguntava o que era e ela me dizia ‘não interessa’, mas eu via que era acarajé. Foi com 17 anos que eu voltei a fazer acarajé de novo, para vender”, compartilha.

Vivendo desse ofício desde os 17, hoje, aos 65, Raimunda afirma que nunca vai parar de fazer acarajé: “é pra vida toda. Vou me aposentar da venda um dia, mas o acarajé eu não vou parar. Porque é de raiz, eu sou de raiz africana, não tem como deixar de fazer”.

No estado da Bahia, ocorrem celebrações anuais da data no Centro Histórico de Salvador, com realização de desfile e missa ou culto religioso dedicado às baianas. Raimunda explica que, apesar de não poder comemorar o dia das Baianas de Acarajé com a grandiosidade das festas de Salvador em Sorocaba, é uma alegria a época dessa celebração coincidir com a do dia da Consciência Negra (20 de novembro), permitindo, assim, que ela possa vender e festejar com uma intenção que considera semelhante.

A revolução histórica que as baianas trouxeram consigo é esclarecida por uma visão trazida por Luzia: “o acarajé é uma comida que surgiu no Golfo de Benim e ainda foi trazida para o Brasil, então, as mulheres escravizadas que tinham autorização para mercar foram as primeiras empreendedoras negras do mundo.”

O prato é o sustento, não só alimentar, mas da família, da fé e da tradição para as profissionais. “Pra mim, o acarajé é minha vida inteira, porque é aqui que eu arrumo meu pão de cada dia. Eu sou mãe solo e aqui que me sustento.”, conta Raimunda.

“O acarajé é meu marido, é meu pai, é o que me dá tudo que eu tenho. Com ele eu não consigo mais passar despercebida! As pessoas me veem às vezes na rua e dizem ‘ai, você é famosa!’. Eu digo: ‘Não, famoso é o acarajé’.”, conclui Luzia.

Saiba mais

Para acompanhar o trabalho de Luzia, acesse o perfil no Instagram @acarajedaluzi. Já Raimunda pode ser encontrada em seu ponto de venda que fica na Rua Antônio Silva Saladino, no Vitória Régia, em Sorocaba, ao lado do mercado Rede Bom Lugar, e pelo WhatsApp 15 99848-5634.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *